Minha banda paulista predileta. E o Ultraje, diria alguns? O Ultraje é de Marte, não deve competir com meros Terráqueos. Durante muito tempo, passei a desenvolver a consciência da necessidade de uma certa sapiência sobre a vida, aquela coisa de ter noção que um bucado de coisa está além de sua compreensão, e que decisões durante a sua vida são muito, muito difíceis.
Uma hora você é um filho, um dia será um pai, quem sabe um avô. De estagiário será um profissional, um chefe, um diretor, um presidente. De ficante será namorado, marido. Ou, como Deus joga dados, você poderá sair do nada para a porra nenhuma, sem nem ter notado, e o curso nunca terá seguido. A vida não é um rio, nem um castelo de cartas marcadas, ela se bifurca e assume várias definições, basta você descobrir qual curso é mais adequado ao seu coração.
Se existe uma banda na música brasileira que transforma essas preocupações em canções, é o Ira! (é, com exclamação, diferentemente do exército revolucionário irlandês). Em 1986, O Ira! lançou Vivendo e Não Aprendendo. Seu segundo disco tem uma maturidade e uma visão ampla sobre temas recorrentes a qualquer cidadão de meia-tigela que supera várias bandas da mesma época, era e é rock de gente grande.
Crescer com um disco desse ao lado, é algo que lhe marca por toda a vida, sua acepção te dá formas novas de olhar sobre diversos aspectos dessa existência chechelenta. Ou seja, se eu conseguir afastar Luan Santana, NX Zero e Restart dos ouvidos do meu filho, e ele ouvir 'Quinze Anos', será um homem. Simples assim.
O Ira! nasceu em 1981, em São Paulo. Edgard Scandurra (o maior guitarrista de sua geração) tinha uma banda punk onde entoava coisas do Led Zepellin, irônicou ou não, é quase um Jimmi Page brasileiro. A banda se chamava Subúrbio. Conheceu Nasi, o Marcos Valadão Rodolfo no Colégio Brasílio Machado. Nasi entraria para a banda, e 'Pobre Paulista' começaria a tocar pra caramba em São Paulo na década de 80. O serviço de Scandurra no exército, deu ao rock nacional a criação do Ira! e a composição de 'Núcleo Base'.
A primeira faixa desse disco, já é um sensacional cartão de visitas. 'Envelheço na Cidade' é uma comprovação da ligação do homem contemporâneo com o caos urbano onde vive. Aqui, onde os anos passam quase desapercebidos, sua vida se constrói e você, cara pálida, nem nota. 'Dias de Luta' contém um dos versos mais bonitos que já ouvi: se meu filho não nasceu, eu ainda sou o filho, quase uma Father And Son recriada por Edgard Scandurra.
O constante auto-conhecimento presente nessas faixas, desemboca em 'Quinze Anos', uma nostálgica e bela composição sobre um homem revivendo seu passado. A máscara tão bem cultivada parece muito frágil diante da finitude da vida. As lembranças, os amores, as amizades, tudo parece uma lembrança antiga que permeeou a vida daquele que apesar de ter vivido, parece não ter aprendido.
'Flores em Você', o grande hit desse disco, foi tema de novela global, o que vocês devem imaginar o quanto elevou essa turma no mercado industrial, coisa que diminuiu bastante depois que o Ira! se recusou a tocar o playback da própria no Globo de Ouro da Vênus Platinada.
No ano de 1986 foi lançado grandes discos: Dois da Legião Urbana, Cabeça Dinossauro dos Titãs e Selvagem dos Paralamas do Sucesso. Eu, em minha modesta e inocente opinião, considero esse o maior lançamento do ano. Mas, não vão na minha, afinal, continuo vivendo e não aprendendo.
01- Envelheço na Cidade
02- Casa de Papel
03- Dias de Luta
04- Tanto Quanto Eu
05- Vitrine Viva
06- Flores Em Você
07- Quinze Anos
08- Nas Ruas
09- Gritos na Multidão
10- Pobre Paulista
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Gosto muito da banda e deste disco. Muito bom o seu comentário. Sem cinema e música a vida seria um erro. E sem literatura seria o quê?
ResponderExcluirSem literatura a vida seria conformismo e submissão.
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